Se ele não voltar, você terá que lidar firmemente com
seu coração. Terá que se virar sozinha como já vivia antes dele, juntar os
pedaços e a cauda do seu vestido de cinderela e se acostumar com um mundo sem
seu amor. Você não é capaz disso, eu sei, mas acredite: nenhum de nós seria.
Perder ou nunca mais saber de uma pessoa querida é incompreensível e dói demais:
tanto pelo sentimento de perda quanto pela confusão de tentar entender o que
nunca será entendido e, o pior, se acostumar com dormir com a cama vazia ao seu
lado..
Eu conversei com ela num dia quente depois que
voltei da Unisinos: meu primeiro livro acabara de sair, eu estava eufórica
porque acabava de participar de minha primeira entrevista, e ela estava sentada
ali, de pernas cruzadas, tranquilamente no banco da praça. Teve que vir até meu
encontro porque, a despeito do que eu sentia, nem consegui a reconhecer. Ela
pega carona todo dia com minha mãe para a cidade vizinha, se revezando nos
carros, mas comigo mesma, nunca havia falado. E eu conhecia sua história
daquele jeitinho das cidades pequenas, por cima e aumentado algumas vezes em
elefantes. Super simpática, veio ao meu encontro e começou a conversar. A
temperatura batia tranquilamente na casa dos trinta graus e como nós duas
desfrutávamos de uma casquinha imperdível de sorvete, nossa conversa logo
começou animada.
Falamos sobre o livro, meu dia na Universidade,
minha entrevista, meus sonhos para o futuro. Ver uma mulher mais velha e madura
como ela me incentivando me deu forças extras (como se eu já não tenho muitas
para divulgar meu livro a todo momento..rs) Bem, conversa vai, conversa vem..
Chegamos no assunto. O tal assunto que eu tinha ouvido falar dela, por cima,
tão mal contado que resolvi aprofundar. E, pensem o que quiserem, isso tocou
meu coração. Conseguir se colocar no lugar dos outros atualmente é um
privilégio: sair do mundo que nos detém abre a mente e faz bem para o coração
de tal forma que nem imaginamos.
E a história foi mais ou menos assim:
“Véspera de dias das mães. Ela tinha o marido, e
três filhos. O marido era caminhoneiro, viajava para outros estados, passava
dias fora. E ele foi viajar no dia das mães. Ela até tinha comentado dele não estar
ali justamente nesse dia.”
Curiosa, pedi: “E como ele era com você?”
“Muito carinhoso”, ela contou. “Sempre mandava
flores, cuidava dos filhos, era muito amável e responsável.”
“Aquela véspera foi a última vez que ela o viu. Ele
virou a esquina para nunca mais voltar, e nunca mais ser encontrado. Depois de
alguns dias, o desespero bateu. Ela tentou ligar e ele não atendia, as chamadas
começaram a cair na caixa postal e dali para o indisponível. A polícia foi
chamada, o caminhão nunca mais foi encontrado, a dor crescia com capim-limão no
coração. E jamais deu para o arrancar, o trocadilho nunca foi tão doloroso.
Além da dor de não saber o que acontecia com ele, os dias passavam e ela precisava,
também, sobreviver. O que fazer? Como cuidar de três filhos pequenos sozinha? Até
então, ele era o único responsável pelas finanças da casa, o cuidado com os
filhos, as contas, o aluguel. Em desespero, ela vendeu terrenos, começou a
trabalhar em meio ao choro, o tempo passou e a cidade toda também passou a
saber do incidente. Ah, claro, vieram as más línguas costumeiras, que para
piorar a situação, cogitaram milhares de falsas hipóteses: a abandonou, a
traiu, a deixou, milhares de hipóteses sem fundamento algum, vindas de corações
vazios e pequenos. Sim, ele a deixou. Mas a dor era dela e ninguém era auto-suficiente
para a julgar assim. A cama vazia era dela. As lágrimas eram dela. A casa silenciosa
sem o barulho do pai amigo e esposo eram dela. Dela e dos filhos, únicos que
souberam verdadeiramente a dor de perder alguém e viver em meia-vida. Meia-vida
deixada ao pé de uma estrada, mergulhada no silêncio, no mistério, nas orações,
no desconsolo. Depois desse dia, o até então marido nunca mais votou, não renovou a carteira de habilitação, nem foi
encontrado nenhum outro registro de sua identidade. “
Na voz dela: “Ele desapareceu há mais de vinte anos,
e só Deus sabe onde ele pode ter se perdido e desconhecido para nunca mais
voltar.”
E em momentos como esses, eu fecho os olhos e paro
para pensar. Na família, nos amigos, em Deus e sua poderosa mão que só ele sabe
o quão bem faz as coisas, por mais que não conseguimos às vezes entender. Penso
na rotina inconfundível de meu andar, nos sonhos distantes, e no quanto é
importante estar feliz com o sonhar, mas principalmente com o nosso realizar.
Amanhã não existe. Tudo, absolutamente, é hoje. Se você não o aproveitar,
adeus. É tchau para nunca mais. E aquele tão sonhado beijo, abraço e palavra trancada
na garganta pode nunca mais sair. Então diga que você ama. Abrace. Beije. Deixe
sua mensagem de carinho e ajude os outros. Seja humilde, porque desse mundo
todos nós fazemos parte e dele todos nós iremos partir para uma melhor. A vida
é uma escolha: pode ser boa ou ruim, alegre ou deprimida. Tudo depende do que
você mentaliza ao amanhecer, da forma com que você encara os problemas, os
desafios, os sonhos. Ah, os sonhos.. Você não faz ideia do quanto eles são
importantes! Não faz ideia do quanto nos fazem viver, crescer, amadurecer, e
por ventura ou não, deixar nosso caminho mais enraizado. Precisamos dessas
raízes porque, um dia lá na frente, pouco a pouco vamos nos desligando das
pessoas mais importantes para nós, queiramos ou não. Para não sucumbir ou cair
em desespero, você precisa ter os pés firmes e o coração forte, exatamente como
fez essa mulher 20 anos atrás. Aliás, ela está namorando um novo homem. E muito
feliz. E essa é a única razão para eu ter escrito esse post. Para tudo há um
jeito. Basta você não desistir da vida, e principalmente, de você.”
Um beijo carinhoso,
Vanessa Preuss
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